segunda-feira, 23 de maio de 2016

Meditação
Por Maria de Lourdes Farias

Meu pensamento é um caminheiro errante; ora malcomportado, ora companheiro, ora exigente... mas hoje ele me levou para visitar algumas lembranças, alguns outros pensamentos e personagens.
Eu quis, por um instante, fazer uma meditação e deparei-me comigo mesma. Como é difícil e complicado um encontro comigo mesma! Mas me enfrentei, “de arma em punho”, colocando nas prateleiras da minha existência, exemplos tão valiosos de pessoas cujos caminhos cruzaram com os meus e outros tantos e tantos que ainda na terra me valem de modelo para que, visíveis, sirvam de colírio sagrado que me faça enxergar o que ainda não consigo ver ou sentir. Iniciei então a arrumação:
A primeira visita foi a você, meu pai, José Adonias, de quem revi os seus seis intermináveis últimos anos de vida. Passo a passo caminhei por este período, pelos caminhos do sítio Panasco e por TUDO que ali vivemos; também caminhei pelos seus dias e noites não menos intermináveis, naquele silêncio dorido, à luz de uma lamparina a gás; andei pelas observações de adolescente que silenciosamente calavam em minha alma ao seu respeito nesse período, quando eu NADA compreendia nem tinha notícia de sofrimento, de felicidade, de vida, de amor, pois o meu mundo era limitado aos meus sentimentos natos de menina-moça que apenas conseguia enxergar mais longe que algumas outras da minha idade; fui pelo quadro físico, emocional, psicológico e econômico do pequeno espaço que nos acolhia naquele casarão gostoso de se viver que me deixou tanta saudade e, não encontrei o menor detalhe que me fizesse lembrar sequer um gesto seu que significasse uma comunicação qualquer da sua dor...
A segunda visita foi a você, minha mãe, Rita Farias, e aí sim, eu já conhecia TUDO o que seria necessário para compreender e sentir a sua dolorosa trajetória que lhe fez anjo na infância, valente e destemida na adolescência e maturidade, mártir na velhice; e numa viagem que me fez rever seus dias, noites e madrugadas dos seus últimos15 anos que somaram uma eternidade, também não encontrei o mínimo sinal que fosse de uma comunicação sua de um sofrimento tão devastador; ao contrário, encontrei frases heroicas como “Deus seja louvado!”, “estou muito bem” e vi também silêncios, quietude, serenidade, belos e emocionantes sorrisos e gestos de santidade...
Mais um encontro foi com você, meu tio Alfeu, o frei Boaventura, que na sua profunda humildade e sabedoria me fez sentir o valor e a importância da união perfeita com Deus, empanando com a sua vida de total doação, um sofrimento que poucos ou ninguém na terra tomou conhecimento, o que culminou com sua entrega total, seu tempo aqui conosco, com a escolha solitária e sem testemunha do momento de seu encontro definitivo com Deus no céu.
Cheguei a você, meu mano Juvenal, no instante em que eu, com apenas quatro anos de idade, não podia compreender o que acontecia, mas lhe vi e revi aquele instante que gravou na alma de cada um de nós uma lembrança de um momento inexplicável e doloroso (...).
Visitei você, Y. F. P, de quem conheci a experiência cruel de uma vida tumultuada pela dor (...).
E por este caminho encontrei você, M. J. Pessoa, com quem tive a oportunidade de conhecer um lado não menos doloroso da existência humana (...).
Veio ao meu encontro você, meu grande exemplo de sabedoria e espiritualidade, Ir. Zélia, e revi aquele largo sorriso encantador, puro e cheio de acolhimento com quem, ainda na minha juventude, aprendi valores profundos e ensinamentos que carrego zelosamente pela vida (...).
Encontrei você, V. N. de Souza, com e de quem conheci a grandiosidade de uma alma, aquela que o sofrimento e a dor não lhe conseguiram tirar a serenidade (...).
Você não poderia faltar neste trajeto, D. F. Pereira, que me deu várias oportunidades de conhecer e sentir em ação o amor e também os mais variados aspectos do sofrimento (...).
Procurei também você, M. N. S. que apesar de certas circunstâncias, me fez conhecer como age um ser humano justo, humilde, grandioso, valente e destemido em todos os sentidos da vida (...).
(...)
Sorteei estes exemplos para minha introspecção, no entanto, há muitos e muitos outros que deixaram marcas indeléveis de fortaleza, sabedoria, fé, humildade, amor, grandeza, justiça etc. bem como um sem número dos que neste espaço terrestre são exemplos, os mais diversos e ricos e, não tenho a pretensão de me comparar a nenhum, pois nada me falta, nada me causa sofrimento. A vida me acolheu e me recebeu sempre em festa e só tenho o que agradecer, o que comemorar.
Viver é uma arte e o palco da vida é permanentemente pronto para atuarmos em grande estilo... e não são poucos os artistas da vida.

Ser feliz e fazer os outros felizes é antes de tudo uma obrigação porque quando somos felizes contagiamos todos os que estão ao nosso redor, sedentos do apoio, atenções, amor e acolhimento que somos capazes de dar e doar. Olhar para dentro de nós mesmos é sempre salutar porque nos obriga a faxinar a nossa alma que em várias ocasiões sofre a tentação de reclamar ou sofrer ou fazer os outros sofrerem sem nenhuma razão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário