Meditação
Por
Maria de Lourdes Farias
Meu
pensamento é um caminheiro errante; ora malcomportado, ora companheiro, ora
exigente... mas hoje ele me levou para visitar algumas lembranças, alguns
outros pensamentos e personagens.
Eu
quis, por um instante, fazer uma meditação e deparei-me comigo mesma. Como é
difícil e complicado um encontro comigo mesma! Mas me enfrentei, “de arma em
punho”, colocando nas prateleiras da minha existência, exemplos tão valiosos de
pessoas cujos caminhos cruzaram com os meus e outros tantos e tantos que ainda
na terra me valem de modelo para que, visíveis, sirvam de colírio sagrado que
me faça enxergar o que ainda não consigo ver ou sentir. Iniciei então a arrumação:
A
primeira visita foi a você, meu pai, José Adonias, de quem revi os seus seis intermináveis
últimos anos de vida. Passo a passo caminhei por este período, pelos caminhos
do sítio Panasco e por TUDO que ali vivemos; também caminhei pelos seus dias e
noites não menos intermináveis, naquele silêncio dorido, à luz de uma lamparina
a gás; andei pelas observações de adolescente que silenciosamente calavam em
minha alma ao seu respeito nesse período, quando eu NADA compreendia nem tinha
notícia de sofrimento, de felicidade, de vida, de amor, pois o meu mundo era
limitado aos meus sentimentos natos de menina-moça que apenas conseguia
enxergar mais longe que algumas outras da minha idade; fui pelo quadro físico,
emocional, psicológico e econômico do pequeno espaço que nos acolhia naquele
casarão gostoso de se viver que me deixou tanta saudade e, não encontrei o
menor detalhe que me fizesse lembrar sequer um gesto seu que significasse uma
comunicação qualquer da sua dor...
A
segunda visita foi a você, minha mãe, Rita Farias, e aí sim, eu já conhecia
TUDO o que seria necessário para compreender e sentir a sua dolorosa trajetória
que lhe fez anjo na infância, valente e destemida na adolescência e maturidade,
mártir na velhice; e numa viagem que me fez rever seus dias, noites e
madrugadas dos seus últimos15 anos que somaram uma eternidade, também não
encontrei o mínimo sinal que fosse de uma comunicação sua de um sofrimento tão
devastador; ao contrário, encontrei frases heroicas como “Deus seja louvado!”,
“estou muito bem” e vi também silêncios, quietude, serenidade, belos e
emocionantes sorrisos e gestos de santidade...
Mais
um encontro foi com você, meu tio Alfeu, o frei Boaventura, que na sua profunda
humildade e sabedoria me fez sentir o valor e a importância da união perfeita
com Deus, empanando com a sua vida de total doação, um sofrimento que poucos ou
ninguém na terra tomou conhecimento, o que culminou com sua entrega total, seu
tempo aqui conosco, com a escolha solitária e sem testemunha do momento de seu
encontro definitivo com Deus no céu.
Cheguei
a você, meu mano Juvenal, no instante em que eu, com apenas quatro anos de
idade, não podia compreender o que acontecia, mas lhe vi e revi aquele instante
que gravou na alma de cada um de nós uma lembrança de um momento inexplicável e
doloroso (...).
Visitei você, Y. F. P, de quem
conheci a experiência cruel de uma vida tumultuada pela dor (...).
E por
este caminho encontrei você, M. J. Pessoa, com quem tive a oportunidade de
conhecer um lado não menos doloroso da existência humana (...).
Veio
ao meu encontro você, meu grande exemplo de sabedoria e espiritualidade, Ir.
Zélia, e revi aquele largo sorriso encantador, puro e cheio de acolhimento com
quem, ainda na minha juventude, aprendi valores profundos e ensinamentos que
carrego zelosamente pela vida (...).
Encontrei
você, V. N. de Souza, com e de quem conheci a grandiosidade de uma alma, aquela
que o sofrimento e a dor não lhe conseguiram tirar a serenidade (...).
Você
não poderia faltar neste trajeto, D. F. Pereira, que me deu várias
oportunidades de conhecer e sentir em ação o amor e também os mais variados
aspectos do sofrimento (...).
Procurei
também você, M. N. S. que apesar de certas circunstâncias, me fez conhecer como
age um ser humano justo, humilde, grandioso, valente e destemido em todos os
sentidos da vida (...).
(...)
Sorteei
estes exemplos para minha introspecção, no entanto, há muitos e muitos outros
que deixaram marcas indeléveis de fortaleza, sabedoria, fé, humildade, amor,
grandeza, justiça etc. bem como um sem número dos que neste espaço terrestre
são exemplos, os mais diversos e ricos e, não tenho a pretensão de me comparar a
nenhum, pois nada me falta, nada me causa sofrimento. A vida me acolheu e me
recebeu sempre em festa e só tenho o que agradecer, o que comemorar.
Viver
é uma arte e o palco da vida é permanentemente pronto para atuarmos em grande
estilo... e não são poucos os artistas da vida.
Ser
feliz e fazer os outros felizes é antes de tudo uma obrigação porque quando
somos felizes contagiamos todos os que estão ao nosso redor, sedentos do apoio,
atenções, amor e acolhimento que somos capazes de dar e doar. Olhar para dentro
de nós mesmos é sempre salutar porque nos obriga a faxinar a nossa alma que em
várias ocasiões sofre a tentação de reclamar ou sofrer ou fazer os outros
sofrerem sem nenhuma razão.
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