sábado, 19 de setembro de 2009

TRANSCENDÊNCIA RELIGIOSA


PROVÍNCIA NOSSA SENHORA DAS NEVES
ENCONTRO DOS EDUCADORES DO ENSINO RELIGIOSO DAS ESCOLAS PRONEVES

TRANSCENDÊNCIA RELIGIOSA

Ir. Aurélia Sotero Angelo FDC
Docente das cadeiras de Antropologia Teológica e Filosofia da FCNSN

1. “A transcendência religiosa é uma projeção para o infinito” (Revista de Estudos da Religião Nº 2 pp. 79-119), se constituindo numa realidade que só os seres humanos se dão conta, pois sua capacidade de pensamentos mais complexos comporta a dimensão tanto mais superior como mais profunda do ser.
2. Do ponto de vista cultural e religioso, Abraão foi o primeiro ancestral bíblico, de que se tem notícia conforme pesquisa que teve o insight de um Deus único e pessoal, isto é, teve a experiência do contato vivencial com Deus – experiência possível mediante a fé, cuja distância da compreensão racional, dificulta o seu alinhamento com a razão e a ciência. Essa figura quando explorada pela arqueologia nos faz chegar à primeira civilização de que se tem notícia sobre a terra, a sumeriana. Três grandes religiões proféticas tem Abraão como pai da fé, todavia o enredo de sua história de vida divergirão entre si. Ex.: judaísmo e cristianismo tem no filho Isaac, cuja mãe é Sara, a figura central através de quem o Senhor coroa Abraão com uma posteridade, na qual se dará a realização da promessa do Salvador. Já no Islamismo é a figura de Ismael que ganhará destaque mediante o enaltecimento da figura de Agar, a mãe escrava, que Maomé maximizará em favor da coesão das diferentes tribos árabes que, eram nômades sem vinculação entre si. Unificando-as em torno do Patriarca na linha de Ismael, Maomé consegue imprimir uma identidade comum para estes povos criando o Islã. Há muitos mitos fora do âmbito das religiões que remetem à lembrança do Abraão das religiões: judaísmo, cristianismo e islamismo. Aqui, portanto, pode-se perceber quão entranhada na cultura dos povos, está a inclinação para buscar entender os mistérios. Os mistérios fascinam exatamente porque nos dizem respeito. Assim, questões, como o sentido da vida, a morte, os males, inquietam e perturbam mesmo os mais apáticos sobre o tema.
3. Quando se fala da pessoa em desenvolvimento, pensa-se imediatamente nas diversas fases da vida desde a infância. Na vida da fé não é diferente, pois que aí também há um impulso para o Alto. Todavia o humano e o espiritual não são realidades estanques. Já dizia Santo Tomás de Aquino: “A Graça supõe a natureza”, Isto é, o sobrenatural supõe o natural, de modo que realidades mais profundas e inefáveis não são inacessíveis, desde que o ponto de partida seja o estágio em que a pessoa se encontra. Portanto, também para compreender a dinâmica da transcendência da pessoa é preciso compreender a estrutura do humano sem prescindir o dado espiritual. Em outras palavras: o dado espiritual é um componente fundamental do humano, que não nos deve retirar da realidade humana psicossomática, mas o processo de humanização é exatamente a integração da dimensão antropológica tripartite: noopsicosomática. É exatamente na dimensão noética (=noo; nous; uno; princípio; espírito, mente pensante) que se encontra o privilegiado espaço do sagrado, da sede das verdades que não tem fim, o lugar da fé; o Santo dos santos; aquele lugar onde, para entrar, é necessário tirar as sandálias, ao modo da experiência de Moisés para falar com Deus.
4. Foi a partir de um modelo de compreensão antropológica, que alguns místicos desenvolveram um caminho marcado por duas bases essenciais para a dinamização do espaço do Sagrado: a Imagem e a Palavra. Ex: Agostinho: modelo antropológico tripartite (trinitário); João da Cruz: escada (subida do Monte Carmelo) – degraus para a perfeição. Teresa D’Ávila: castelos ou moradas. Teilhard Chardin: evolução para o ponto ômega (perfeição de Cristo) e introdução da noosfera (conceito original do mineralogista e geoquímico Vladimir Vernadsky), camada pensante, nas já conhecidas camadas da terra (geosfera e biosfera).
5. Se “transcendência é uma projeção para o infinito”, há que se encontrar uma linguagem própria de acesso ao lugar sensível ao mistério e ao sagrado. Uma vez compreendido este requisito, educadores, psicólogos, professores, diretores espirituais, e todos quantos são sensíveis ao humano em formação, necessitam lidar com o mundo do simbólico ao modo do Mestre de Nazaré que precedeu em excelência sem igual no maravilhoso ensinamento do Projeto do Pai. Ex: Parábolas, uso de símbolos nas curas, imagens, gestos, olhar, toque...
6. A civilização do século XXI não é diferente da civilização mais arcaica que habitou a terra porque, no fundo, é o mesmo humano em sua estrutura essencial, com as mesmas necessidades fundamentais. A diferença é que a atual encontra-se em um meio muito mais complexo e sofisticado, ainda que haja quem não seja beneficiado por tais milagres da ciência e da tecnologia. Sendo assim, podem-se indicar aqui os princípios de acesso ao coração da criança, do jovem, do adulto e do idoso de hoje:
7. A solidariedade é muito eloquente para o homem contemporâneo. Gestos de solidariedade são belos de se ver, portanto atrai e consolida a credibilidade das intenções. Isto significa que nunca é demais ao Ensino Religioso manter um programa permanente que promova o exercício da solidariedade mesmo nas mínimas proporções, atuando sobre a formação do coração através da arte de partilhar que deve ser introduzido muito cedo entre as crianças.
8. Atos de heroísmo, enquanto história pessoal de vida envolvida com causas nobres de superação das dificuldades próprias ou de outros, são atos que repercutem de modo edificante e atraem o homem contemporâneo para a luta pela sobrevivência. Vale a pena o Ensino Religioso investir na juventude a apresentação de líderes da fé ou de causas sociais, focalizando a pessoa de Jesus Cristo, de modo a sensibilizar para o protagonismo da juventude.
9. A oração é aquele momento muito mais de aquietar o coração do que de somatório de palavras. Portanto, o educador da equipe de Ensino Religioso precisa investir em si mesmo no que diz respeito ao ardor apostólico, para desenvolver métodos de promoção da oração no seu sentido mais simples e pleno. Com certeza a civilização atual é muito mais intuitiva e emocional, cuja tendência mística mais acentuada não se coaduna com textos sem alma que, muitas vezes, não brotaram do coração, mas é uma colcha de retalhos de cópias outras. Aqui, o educador é convidado a rever sua própria vida, pois sua paixão pela transcendência dos outros (alunos), implica sua própria paixão pelas coisas do alto e o cultivo da vida com Deus.
10. O silêncio é o momento do contato consigo mesmo, um itinerário que, mais cedo ou mais tarde, vai levar ao contato com o espaço sagrado de um modo cada vez mais consciente. Aqui valeria a pena o Ensino Religioso desenvolver ocasiões extrasala voltados para a juventude como oportunidade opcional de dinâmica de grupo (pequenos grupos) como uma terapia transcendental. Para tanto, seria importante a definição partilhada na equipe de educadores sobre a terapia de uma forma responsável. Nela o foco seria cultivar a quietude, a solitude, buscando a consolação, a serenidade em Deus. Assim, estariam atuando na alma para minimizar a agressividade, a euforia, a depressão, males da alma que são recorrentes nos jovens da atualidade. O Ensino religioso é convidado a olhar para a pessoa humana que é cada um de seus alunos em formação e, muitas vezes, em conflito. Olhar personalizado...
11. O homem contemporâneo, diferente do homem moderno que era muito mais racional, é sensível ao entorno, buscando com ele sintonizar. Trata-se da inclinação para a interação com o cosmos. Ótima disposição de espírito para que o Ensino religioso potencialize essa tendência são as ocasiões extrasala, tais como passeios, ambientes abertos, parques, viagens, piqueniques, esportes, jogos, recreações diversas, nas quais os conteúdos de natureza religiosa possam perpassar as vivências imediatas, tornando-as significativas. Assim fazia Karol Woitila, o saudoso papa João Paulo II, em sua longa trajetória de vida dedicada à juventude: no escotismo, no teatro, na literatura. Veja a contribuição do seu Pontificado: a criação das Jornadas Mundiais da Juventude. Por que não inserir nossos jovens em projetos maiores, comunitários, regionais, nacionais, internacionais? De que modo o Ensino Religioso está antenado com os acontecimentos do Brasil e do mundo? Como nos inserimos em Projetos do tipo: Fóruns Sociais Mundiais, Jornadas Mundiais da Juventude, “Os Objetivos do Milênio” (projeto de erradicação da pobreza e sustentabilidade do planeta assumido pela ONU), Campanhas da fraternidade, inclusive de caráter ecumênico, etc, etc e etc....
12. Os mistérios ocultos são os temas que mais fascínio exercem no homem contemporâneo. De todo não deveria ser uma preocupação, se considerarmos que esse dado se constitui exatamente na tendência natural para o sobrenatural. A verdade é que o atraente está exatamente em não perdermos a magia do mistério. Assim o Ensino Religioso nem pode, nem deve ter o domínio das respostas, nem tampouco a pretensão de se apresentar como detentora da verdade. Deve lembrar-se sempre do alerta do Senhor Jesus “o Espírito sopra onde quer”. Não se esqueça que a natureza evangelizadora do Ensino religioso é propositiva, e nunca doutrinária. Somente quando o destinatário da evangelização faz sua opção consciente, isto é, verdadeiramente atraída pelo sentido último de sua vida, é que se submete ao processo seguinte, a catequese, cuja natureza, aí sim, é doutrinária.
13. Já na evangelização Jesus Cristo é apresentado, pois ele é o conteúdo do anúncio. O espaço da sala de aula é um espaço de evangelização, portanto o educador cristão não se exima de anunciar Jesus, como proposta de vida. Com certeza Ele, Jesus Cristo, o Crucificado, por si só atrai para si, o mundo todo e todo o mundo. Esse é um dado profético que uma Instituição confessional Católica, não pode descuidar. Cuide-se, portanto, para que evitar o “psicologismo”, cuja desvinculação do sentido do transcendente não venha a confundir a natureza do Ensino Religioso, que é o lugar da evangelização, lugar de lançar as sementes, respeitando a pluralidade e as diferentes opções religiosas, sem agredir, mas também sem omitir a proposta cristã. Em outras palavras, não se queira manipular a fé cristã, evitando apresentar o Crucificado, substituindo-o por uma forma amenizante da dor, que apresenta o Cristo sem cruz. Que não haja temor em apresentar o Cristo Crucificado, cuja riqueza de sentido noopsicosomático possui resposta plena para a realidade noopsicosomática de cada um que com ele se encontra verdadeiramente.
Conclusão: Não se concebe um educador, principalmente aquele que dinamiza o Ensino Religioso, não se inteire sobre questões pertinentes a sua área. Daí a sugestão de que, faça parte da pauta de aprofundamento da equipe temas que interajam interdisciplinarmente com outras áreas da vida e do conhecimento, principalmente em se tratando de assuntos que interessam a juventude.


REFLEXÕES

1. A propósito do tema, como me percebo enquanto pessoa humana, cuja atribuição é despertar crianças e jovens para a transcendência religiosa?

2. Qual o estímulo real e ideal para o exercício desse serviço como equipe de Ensino religioso?

3. Qual a espiritualidade das FDC e de que maneira ela perpassa as linhas essenciais das atividades do Ensino Religioso nas Escolas Proneves?


4. Qual a característica marcante do Ensino Religioso Proneves?


5. Quais são as duas bases essenciais do Ensino Religioso Proneves (Imagem e Palavra):


6. Qual o suporte que essas duas imagens essenciais oferecem para o delineamento objetivo das iniciativas da equipe de Ensino Religioso nas Escolas Proneves?


7. Qual a conclusão a que chegou?



OBRAS CONSULTADAS:

BOFF, Leonardo. Do iceberg à Arca de Noé; o nascimento de uma ética planetária. 2. ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.159 p. (Os visionautas)

DALAI LAMA. Uma ética para o Novo Milênio. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.

FEILER, Bruce. Abraão; uma jornada ao coração de três religiões. Rio de Janeiro: sextante, 2003.

MARTIRANI, Giuliana. A civilização da ternura; novo estilo de vida para o terceiro milênio. São Paulo: Paulinas, 2001. 371 p. (Sociologia atual)

MÜLLER, Wunibald. Deixar-se tocar pelo sagrado. Petrópolis: Vozes, 2004.

Revista de Estudos da Religião Nº 2 / 2004 / pp. 79-119 ISSN 1677-1222 Os Universitários e a Transcendência - Visão geral, visão local Jorge Claudio Ribeiro. Disponível em http://www.pucsp.br – acessado em06/09/2009.

TEPE. Walfredo. Antropologia cristã; diálogo interdisciplinar. Rio de janeiro: Vozes, 2003.

TERRIN, Aldo Natale. Antropologia e horizontes do sagrado. São Paulo: Paulus, 2004.
WILGES, Irineu. Cultura religiosa; as religiões do mundo.


IMAGENS:

WALKING WITH CAVEMEN. Produção de Richard Dale, Narrado por Alec Baldwinn, EUA: BBC & Discovery Channel, 2003. 1 dvd documentário (30 min – 4 episódios) color, inglês.

MESOPOTÂMIA: retorno ao Éden. Produção de Joe Westbrrok, Jason Williams, Rober Gardner, Versão brasileira telecine, Barueri: Abril , 1997. 1 fita de vídeo (48 min), VHS/NTSC, cores. (Coleção Civilizações perdidas).

QUEM SOMOS NÓS? Direção de William Arntz, Betsy Chasse e Mark Vicente, Eua: PlayArte, 2004. 1 dvd documentário (108min.), color. Português/inglês.


SOBRE ORGANISMOS E CAMPANHAS SOCIAIS:

http://www.natalvoluntarios.org.br/objetivos_do_milenio/download/relatorio_seminario_odms2005.pdf

http://www.jmj2011madrid.com/

http://www.forumsocialmundial.org.br/

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